No último período estamos vivenciando um surgimento e fortalecimento dos movimentos identitários, pós-marxistas, multiculturalistas, ou seja, agrupados genericamente no termo “pós-modernos”. Mas como diz Ellen Wood: “…que socialista sério alguma vez desprezou as divisões raciais e sexuais no seio da classe operária?” Por isso, o partido tem se dedicado a dar embasamento teórico e prático a sua militância afim de enfrentar essa questão, que não é nova e como em 68 os movimentos antimarxistas tem surgido e ressurgido.

Considerando que todos os que lerem esse texto são marxistas leninistas, quero me dedicar a contribuir com algumas insuficiências de nossa ação, mas primeiro quero partir da seguinte leitura da realidade: o nosso povo é uno mas as suas contradições tem cores. E bem marcadas.

Dados apontam que a maioria dos postos de trabalho INFORMAIS são exercidos por negros. A maioria (67%) da população carcerária é negra. 75% dos homicídios no Brasil são cometidos contra jovens negros. A maioria dos pobres são negros. O Brasil nunca teve um presidente negro. Em contra partida, a maioria dos CEO das grandes empresas são BRANCOS. A maioria dos deputados, senadores e governadores são BRANCOS.  A grande esmagadora dos professores universitários são BRANCOS. Carreiras tradicionais como engenharia, juízes e médicos são BRANCOS.
Ainda lutamos para superar as perversas heranças que nos deixou um período escravista de mais de 300 anos. O discurso afro centrado e pan-africanistas que não relacionam a luta anti-racismo a luta anticapitalista estão equivocados para esse fim, mas os comunistas devem compreender o papel de “dupla exploração (raça e classe) fruto das relações de tipo capitalista” (Nkrumah, 1970) que 53% da população brasileira sofre por consequência desse período nefasto de nossa história.
Que o desenvolvimento nacional é o caminho para a superação das explorações não temos dúvidas, mas falar em desenvolvimento nacional sem combater essa lógica perversa da divisão social do trabalho imposta pelo fenótipo é estéril no seio da maioria da população. Combater a divisão do nosso povo que os movimentos multiculturalistas vem tentando, notoriamente financiados pelos EUA, sem abordar o racismo, a cor dos garis e a cor dos médicos tende ao fracasso.
Que brasileiro negro se sentirá representado em um projeto de desenvolvimento que não pretende acabar com essa lógica que os colocam em papeis de segundo plano no trabalho? Essa questão é essencial para sermos capazes de aumentar nossa intervenção no movimento negro, mas também entre os trabalhadores da base do sistema, em sua maioria negros e negras.
Por isso, o programa do PCdoB de Nacional Desenvolvimento precisa incorporar como centro da questão nacional a divisão social do trabalho entre brancos e negros. Não será possível combater o racismo sem combater essa questão. O medo de fazer concessão ao multiculturalismo, que não é necessário para compreender a questão racial no Brasil, não pode embaçar nossa leitura da realidade. Nosso programa precisa apresentar claramente que é necessário desenvolver a nação tendo em vista essas contradições do nosso povo. A divisão pelo fenótipo da cor dos trabalhadores é a logica imposta pelo capitalismo no Brasil e quem não compreender isso está fadado ao dogmatismo.
A tese apresentada pelo Comitê Central ao 14º congresso do PCdoB intitulada “FRENTE AMPLA: NOVOS RUMOS PARA O BRASIL Democracia, soberania, desenvolvimento, progresso social” aparece no corpo do texto a palavra desenvolvimento 66 vezes. A palavra negros aparece 3 vezes e racismo apenas UMA ÚNICA vez no ponto sobre balanço das ações do governo Lula e Dilma. Na terceira parte da tese “III – GOVERNO ILEGÍTIMO CONTRA O BRASIL E O POVO” há duas partes seguidas chamadas “Projeto nacional de desenvolvimento para dar novas perspectivas ao país” e “Ir ao encontro dos anseios do povo” que não abordam, nem lateralmente, essa questão da divisão social do trabalho a partir do fenótipo da cor da pele. É urgente a reformulação desses pontos e a inclusão dessa perspectiva se queremos ser capazes de criar uma síntese socialista para o nosso Brasil. A escravidão deixou marcar profundas que precisam ser encaradas de frente por nós marxistas. No Brasil a questão nacional tem cor.
*Felipe Garcez é membro da executiva estadual da UJS-RJ, membro convidado do comitê municipal do PCdoB de Niterói e estudante de Produção Cultural da UFF.