Já tratei deste tema no Congresso anterior e volto a ele neste 14º Congresso pela sua importância fundamental para a nossa estratégia. Ouço quase todos os dias dentro e fora das fileiras partidárias, o termo “classe trabalhadora”. Muitas vezes penso que nós, marxista-leninistas, perdemos essa batalha.

Por Lejeune Mirhan*

Os primeiros que usaram esse termo – “classe trabalhadora” – foram os sindicalistas dos Metalúrgicos do ABC, começando com Lula desde 1979 e todos os que o sucederam. É compreensível que usem essa terminologia. Não são conhecedores da teoria marxista e raciocinam que existe uma classe “dos que trabalham”, ou seja, basta trabalhar para ser proletário.

Do meu ponto de vista tanto nossos sindicalistas quanto nossos dirigentes partidários que usam essa terminologia ambos erram em profundidade. Os dirigentes sindicais quando dizem “classe trabalhadora”, estreitam a concepção, pois eles não devem dirigir à “classe” no sentido marxista do termo, mas devem dirigir a TOD@S os/as trabalhadores/as. Da mesma forma, em sentido inverso, os dirigentes partidários. Devemos nos dirigir prioritariamente ao proletariado.

Nosso Partido, em seu artigo 1º dos estatutos deixa claro que somos o Partido da classe operária e das massas trabalhadoras e “vanguarda consciente do proletariado”. Mas, deixemos os aspectos estatutários e formais de lado. Nos interessa a teoria de marxista na forma como foi formulada.

Marx não nos deixou uma definição precisa sobre classe social. No entanto, nunca lhe passou pela cabeça que “todos os que trabalham pertenceriam à classe”. Quando ele menciona de forma clara a existência de uma classe que está chamada a levar adiante o processo revolucionário que porá fim ao sistema capitalista, ele se dirigia a um tipo especial de trabalhador. Ou nós acreditamos nessa teoria de que o proletariado haverá de conduzir o processo transformador da sociedade, ou temos que mudar nossas concepções.

Quando falamos que Marx sofreu influência de Smith é verdade. No entanto, ele despreza os aspectos idealistas da teoria econômica desse economista inglês. Quando Smith diz que “todo trabalho produz riqueza”, Marx diz que não é verdade. Nem todo trabalho produz riqueza. Só um tipo de trabalho é capaz disso: o trabalho “produtivo”. Na concepção marxista, esse sim um trabalho que acumula, que produz “mais-valia” ou “mais-valor”.

Dito de outra forma: nem todo trabalho enriquece os proprietários dos meios de produção. Uma costureira quando faz um vestido para si não enriquece a si própria com seu trabalho. Mesmo quando faz e vende para ganhar dinheiro com isso, mas sem tomar trabalho de terceiros, é trabalhadora de si própria e explora a si própria como exemplifica Marx (o capítulo onde muitos exemplos esclarecedores podem ser obtidos podem ser encontrados em “Produtividade do capital. Trabalho produtivo e improdutivo”, no Livro IV d’O Capital, Editora Bertrand do Brasil, páginas 384-406).

Para os marxistas é claro que o trabalho improdutivo é aquele que não agrega valor, não faz acumular capital para os burgueses capitalistas, estes sim pertencentes a outra classe social que vivem do lucro e são proprietários do capital. Marx estabelece uma identidade entre classe com fonte de renda. Capitalistas vivem do lucro e proletários do seu salário (Livro 3 d’O Capital). Ele fala ainda de uma terceira classe, os rentistas, mas não vamos tratar disso aqui.

No entanto, é preciso combinar um outro fator determinante para integrar a classe, pois não basta receber salário: é preciso enriquecer outrem com sua força de trabalho. Uma pessoa que tem uma empregada mensalista em sua casa não torna nem ela proletária, nem o seu empregador um membro da “burguesia capitalista”. A fonte de renda com que o empregador paga o salário da empregada é seu salário. E o trabalho dela não o enriquece todos os meses. Ao contrário. O seu gasto está na esfera das despesas e ele na prática fica sempre “mais pobre” com o gasto mensal e nunca mais rico.

Temos dirigentes – sindicais e partidários – que chegam a dizer que desempregados são proletários. Ora, a condição de um trabalhador “ser” proletário é produzir riqueza. Mas, desempregado, como ele faria a proeza de produzí-la? Quem não trabalha não pode produzir riqueza alguma. Temos ainda o trabalhador rural, camponês, dono de sua terra, pequenas glebas, agricultura familiar etc. A terra é seu próprio instrumento de trabalho e sua força de trabalho não acumula riqueza para nenhum burguês. Simples assim. Por fim, os servidores públicos. Basta que perguntemos a que classe social o seu trabalho enriquece? Que riqueza produzem? Podem ser assalariados, podem mesmo ter jornadas estafantes, receberem pouco, mas isso jamais os tornarão trabalhadores produtivos, produtores de “mais-valor” e, portanto, proletários.

É claro que nosso Partido deve estar de braços abertos a todos os trabalhadores, sejam eles proletários ou não proletários, trabalhadores produtivos ou improdutivos. No entanto, a prioridade absoluta do Partido do Proletariado deve ser a classe, aqueles operários produtivos e proletários do setor de serviços, como metalúrgicos; químicos; trabalhadores da alimentação; construção civil; têxteis; urbanitários; condutores; trabalhadores em comunicação; trabalhadores em saúde (privada); trabalhadores em hotelaria; trabalhadores em telecomunicação; trabalhadores em educação (privada); trabalhadores em bares e restaurantes entre outros.

As contradições centrais nas relações de trabalho seguem cada dia mais claras, visíveis. A produção é coletiva e a apropriação do lucro do trabalho é privada. Foi a forma como Marx mostrou as contradições do sistema capitalista.

Se o PCdoB acredita nisso – e não tenho dúvida que continua a acreditar – é preciso que alteremos nossa ação política e sindical e cresçamos de forma vigorosa e consistente no proletariado brasileiro. Que voltemos a usar de forma orgulhosa e com todo o convencimento, o termo “proletário” e não mais “classe trabalhadora”. Estou seguro que isso não é apenas uma questão semântica ou “de facilitar a comunicação com as massas” (sic).

Quero aproveitar para saudar de forma entusiástica, a decisão do CC de estudar mais e melhor, em profundidade esse novo proletariado brasileiro, não necessariamente industrial, mas do setor de serviços. A classe operária industrial seguirá sendo o “núcleo duro” do proletariado.

* Comunista desde 1975. Secretário de Formação do CM do PCdoB de Campinas.