O PCdoB e a esquerda brasileira como um todo enfrentam uma quadra histórica complexa e com desafios inéditos. Evidente que toda esta quadra está submetida à lógica da luta de classes em todas as suas variáveis. Mas é mister afirmar que as táticas e o ferramental utilizadas atualmente pelo capital são eficientes e mais inovadoras que nos períodos anteriores da história do Partido.

Por Gustavo Alves*

A complexidade da sociedade atual, explica em parte a diversidade do arsenal utilizado pelo capital nesta etapa da luta de classes. Poderia tratar aqui de novas formas de acumulação, e formas mais sofisticadas de incorporação de mais-valia como no caso de bens imateriais, cujo maior exemplo é a produção de softwares e assemelhados.

Mas é importante nos concentrar nos desafios que temos nestes tempos em que boa parte das comunicações entre a humanidade passam pelos meios digitais.

Há várias dimensões em que o PCdoB deve se desdobrar, analisar e propor novas práticas nestes tempos digitais.

Uma delas é a segurança, numa acepção mais ampla do que a simples guarda de dados ou gestão de sistemas. A atual modelagem de relacionamento interpessoal lastreado em redes sociais e aplicativos de mensagens eletrônicas traz uma exposição da vida pessoal inédita. Gostos, opiniões e intimidades são publicadas e comentadas quase sem filtros. Um comportamento que aproxima, mas também expõe.

Pois bem, estes tempos também estimulam que muitos militantes e dirigentes tratem o Partido, seus debates e discussões, assim como táticas e estratégias como informações equivalentes e que podem ser divulgadas da mesma forma.

Trata-se de um erro estrutural tratar debates internos e resoluções como assuntos que podem ser reproduzidos nas redes sociais e aplicativos de mensagens.

Não defendo que tratemos nossos debates como caixas pretas isoladas hermeticamente do restante da população, ao contrário disso. Crescer partido pressupõe incluir mais opiniões e contribuições. Mas expô-las nas redes esvazia o debate presencial e adequado. O conforto dos celulares e computadores desobriga o militante de ouvir. O atual desenho das redes favorece a transformação da discussão em uma competição de gritos e frases fortes, justamente o contrário da construção coletiva de uma opinião, posicionamento ou visão.

Há também a inevitável percepção de que a exposição de debates e discussões em aberto, permite às forças que nos combatem conceber um mapa detalhado de nossas forças, nossas fraquezas, nossos caminhos e nossos quadros.

Outra dimensão que necessariamente temos que tratar é a da capacidade de divulgação de nossas ideias.

Embora pareça óbvio, muito camaradas e órgãos não percebem com clareza a real dimensão de nossa presença no mundo digital para a luta de ideias.

Apesar de termos a coragem de desbravar o ciberespaço, com o ineditismo do Portal Vermelho, muitas vezes temos dificuldades de sair da nossa zona de conforto.

Fomos vanguarda na construção de um Portal Plural, que teve momentos de grande protagonismo na comunicação alternativa. Mas também sofremos um atraso grande na construção de uma política coordenada de inserção, divulgação e debate nas redes sociais.

Este atraso, alimentado por um misto de desconfiança no papel das redes juntamente com uma tentativa de se agarrar ao mundo analógico conhecido, trouxe prejuízos grandes e que só recentemente estão sendo enfrentados.

A recente dificuldade de nossa militância em usufruir toda a potencialidade do aplicativo PCdoB Digital, mostra como o atraso compromete também nossa estrutura organizativa.

Alguns parlamentares comunistas e dirigentes construíram experiências exitosas, mas todas elas baseadas na decisão individual, o partido não realizou nenhum debate ou ativo focado neste novo mundo.

O exemplo mais claro de nossa dificuldade é o debate sobre software livre, onde nos equilibramos entre os que defendem o uso exclusivo deste instrumental e outros que defendem que isso é uma questão menor. Independentemente da decisão decorrente deste debate, é importante destacar que não o realizamos de forma adequada, com a profundidade devida nas ações do partido, dos militantes, e mesmo dos espaços onde somos gestores.

Por fim, há a premente necessidade de construirmos de forma coletiva o debate sobre nossa comunicação nestes tempos digitais, pois os momentos sombrios que surgiram após o golpe parlamentar de 2016, irão nos atingir de forma aguda. E a possibilidade que temos de interagir, disputar as narrativas e construir um front estruturado e eficiente na luta de ideias passa necessariamente por um birô de comunicação que leve em conta a atual conformação da comunicação.

Os custos da comunicação clássica (jornais impressos, revistas, programas de rádios e TV’s) sempre foram uma barreira para nossa atuação. O advento da internet surgiu como uma janela de oportunidade nos permitindo falar com milhões de mulheres e homens em todos o Brasil através do Vermelho.

O atual estágio da digitalização, onde redes sociais e aplicativos de mensagens tem ocupado papel central inclusive nas relações interpessoais, nos obriga a avançar neste debate.

Desconhecer esta nova realidade trazida pela digitalização é tão perigosa e ingênua quanto fingir que o imperialismo a utiliza para espionar e minerar informações como foi exposto pela denúncia de Edward Snowden.

Hoje, apesar do esforço de militantes, dirigentes e parlamentares o ciber espaço é amplamente dominado por sites de fake News e personagens hidrófobos.

O partido carece de um momento de reflexão, debate e construção coletiva de táticas e estratégias para este novo front que abarca uma imensa gama de possibilidades e também de ameaças.

Neste Congresso, temos a oportunidade de também enfrentar o neo-ludismo digital que desvaloriza o papel das redes e nos condena ao divórcio com a imensa maioria da população.

*Jornalista, webdesigner e secretário de comunicação do PCdoB/DF